Pelo que eu entendi (com ajuda deste texto) dos sacrifícios que o povo de Israel oferecia conforme as indicações de Moisés, a carne dos animais oferecidos em sacrifícios de ação de graças deveria ser, pelo menos em parte, comido.
Quando Cristo informa que para ter para ter a vida é necessário comer a sua carne e beber o seu sangue, acho que é um dos pontos em que ele está “não abolindo a lei, mas levando-a à perfeição”.
Se antes era a carne dos animais que deveria ser consumida, agora é a carne de Cristo, oferecido de uma vez por todas, que deve ser consumida.
Aparentemente, o sangue dos animais era aspergido sobre o altar e, fora isto, era jogado fora, porque se considerava algo parecido com a vida estar no sangue e ninguém iria beber a vida dos animais (é nisto que as Testemunhas de Jeová ainda se apegam para proibirem doação e transfusão de sangue). Mas o sangue de Cristo é, segundo ele, para ser bebido, e acho que é neste mesmo sentido.
A Igreja Católica fez destes mandatos de Jesus o sacramento da eucaristia, que são, ao mesmo tempo, símbolos e realidades de fé – ou seja, não são carne e sangue materiais, mas sim materializadas, pela fé, no pão e no vinho (não pela fé no pão e no vinho, e sim em Cristo). Pois se fosse de outro jeito, o que conhecemos como Sagrada Comunhão seria apenas uma refeição macabra.
Aqueles sacrifícios de animais, complexos e caríssimos (imagine sacrificar diariamente um bicho, num tempo em que não havia o abate em massa industrializado que há hoje) foram elevados à perfeição por Cristo justamente porque eram representações antecipadas do sacrifício único de Cristo. Se não fosse assim, Deus seria um Deus indeciso e confuso, ora ordenando sacrifícios cheios de regras, ora dizendo que não precisa nada disso. E, além de tudo, não deixa de ser mais elegante uma hóstia do que um boi ensanguentado.
Sem esvaziar o que há de doutrinário e de conteúdo de fé nesta transformação dos sacrifícios em eucaristia, esta passagem de sacrifícios complexos e caros para algo simples e cotidiano (pois é mais comum encontrar alguém que comeu um pão do que alguém matou um boi) serve como metáfora para simplificar as coisas na vida. Não uma simplificação redutora, que é a que ocorre quando se tenta tirar Deus da jogada, mas uma simplificação libertadora, estilo uma Navalha de Occam, que só funciona adequadamente com a necessária participação de Deus.