Simone de Beauvoir: as mulheres são presas da espécie, quer dizer, os “encargos” da espécie são mais pesados para elas (em função da gravidez: menstruar, carregar a criança 9 meses, aleitar, e todas as alterações hormonais implicadas nisso); mas funções biológicas não produzem uma afetividade, pelo contrário: a afetividade é que reveste as coisas, inclusive as funções biológicas.
Não é uma citação textual, mas de cabeça, do livro O Segundo Sexo.
Portanto, se uma garota vem me dizer que é vítima da natureza, nem venha. Ninguém tem a obrigação de engravidar – diga-se de passagem, nem de menstruar, mas é necessário algum dinheiro para isso. Claro que a pressão social para que qualquer mulher tenha filhos é muito forte, e há as que engravidam porque quiseram (curiosidade, realização pessoal, etc) ee as que engravidam porque têm medo do que o vizinho vai falar se ela não tiver filhos. E, para não complicar o assunto, nem vou mencionar o machismo da sociedade.
Mas qualquer pessoa pode se colocar como vítima da natureza, se quiser apesar de tudo. “Oh, como sofro por ser mulher”; “oh, as mulheres sofrem tanto: são elas que parem, que cuidam das crianças, que cuidam da casa, que usam salto alto para ir trabalhar, são elas que gastam centenas de reais com cosméticos…” Tudo bem, pense assim se quiser.
Mas querer colocar a culpa em mim?!?
A geringonça toda que eu carrego no meio das pernas não é responsável pela sociedade machista não oferecer meios de as mulheres terem um acesso muitas vezes sofrido à pílula; assim como não é responsável por investirem mais dinheiro em pesquisas com armas do que com métodos contraceptivos menos agressivos. Se uma garota passa por tormentos relativos à sua menstruação, relativos a uma possível gravidez, ou porque se coloca na posição que a sociedade exige dela, não desconte em mim. Se uma garota é casada com um grosseirão insensível que não a respeita, xingue ele, mas não eu – que nem namorada tenho (e, se uma mulher acha que todos os homens não prestam só porque o dela é que não presta, deveria me dar os parabéns por não ter namorada, e não vir me acusar só porque o cara dela é tosco!). Eu não represento os homens, e nem algum em particular, aliás. Minhas opiniões e minha vida não são representativas de outras pessoas só porque elas têm um saco e um caralho no meio das pernas. E, se você quiser, mesmo assim, me julgar com base nos trogloditas que você conheceu, tenha bem claro que você está só falando das suas experiências ruins com os homens que você conheceu, e não de mim que você nem conhece. E se você achar que somente ser amiga de verdade de uma mulher, isso é problema seu e não meu: quer dizer, o fato de você amar o Clube da Luluzinha e desprezar o Clube do Bolinha (clubes criados por você, dos quais eu não participo, por sinal), isso só significa que é você que se entende melhor com mulheres, e não que eu tenho algum problema (e não estou falando de lesbianismo, que não tem nada a ver com o assunto).
Enfim, essa não é uma atitude generalizada, pelos menos não entre as mulheres que eu conheço (eu acho). Mas me irrita que as pessoas sofram nas mãos de outras e queiram me responsabilizar por isso.