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Quando Jesus menciona o fim dos tempos, o faz por motivos pedagógicos, transmitindo a nós aquilo que o Pai lhe revelou. Ele não usa o fim dos tempos como uma ameaça, e sim como uma advertência integrada ao resto da revelação que nos faz.

Embora nós possamos ouvir ou repetir esta advertência como uma ameaça, este sentido ameaçador deveria ser secundário e passageiro.

Quem é que deseja ir para o céu às custas de uma ameaça? Converter-se para poder entrar no Reino de Deus pode se tornar um utilitarismo ineficaz, um reforço positivo para o bom comportamento, como “ganhar um fuscão no Juízo Final e diploma de bem comportado”, nas palavras de Gonzaguinha em Comportamento Geral.

A conversão do coração é uma condição para entrar no Reino, mas é necessário converter-se como quem aceita os valores do Reino por eles mesmos, e não tendo em vista o Reino: ao mesmo tempo mantendo a esperança de alcançá-lo e vivendo estes valores por eles mesmos, não como moeda de troca (como quem pudesse dizer “fiz tudo o que o Senhor mandou, agora exijo entrar”).

Idéias como a reencarnação ou o materialismo histórico (por mais bem intencionadas que sejam) são dois entre muitos protótipos da tentativa de auto-redenção que se amparam, eu acho, no utilitarismo cuja raiz é focar no medo da perdição em lugar de focar em Deus. Este foco no medo da perdição eterna pode ser, também, foco no desejo de ganhar, ou de ter vantagem, ou no orgulho, etc. Viver os valores do Reino é uma condição para adentrá-lo, mas é a redenção de Cristo que tanto nos franquia a entrada no Reino, quanto (inclusive) gera em nós estes valores.

Não podemos deixar de agir como se tudo dependesse de nós (como diz o adágio “devemos agir como se tudo dependesse de nós, e rezar como se tudo dependesse de Deus”), mas precisamos, primeiramente, aceitar que tudo depende de Deus.