Ser uma pessoa vitoriosa e ser uma pessoa cristã não são duas coisas incompatíveis, mas ser uma pessoa cristã para ser uma pessoa vitoriosa é uma instrumentalização da religião, uma atitude errada, e é inútil, porque não funciona – portanto, é uma coisa errada e inútil.
A Providência divina garante que Deus proverá o necessário para vivermos e sobrevivermos; e Deus promove a justiça entre as pessoas com certeza; mas esta justiça costuma ser mais coletiva do que individual, e quem “ganha uma causa” depois de pedir a Deus por isto é bom que se lembre que é mais provável que tenha ganho esta causa porque isto serve aos planos de Deus e não porque Deus deu razão a quem “ganhou a causa” – pois pode muito bem ser que Deus dê razão a alguém que acha que deveria ganhar, mas perde porque isto não é parte do plano de Deus. O que eu quero dizer é que talvez isto seja o significado de “Quem me estabeleceu para ser vosso juiz…?” em Lc 12,14.
O homem que pede a Jesus o julgamento da divisão da herança talvez merecesse, ou talvez não, e Cristo não se ocupa com isto, mas com o indício de ganância que o pedido do homem revelou. É necessário que nós desenvolvamos o discernimento para agir com justiça, e Cristo não é nenhum Dom Pedro I para exercer o papel de Poder Moderador. A Providência divina é a garantia de Deus, e a justiça divina consiste em orientar tudo para a salvação das pessoas: entre nós, cabe aprender a agir com justiça, e quanto mais este aprendizado for fundamentado em Deus, melhor.
Assim como Cristo não é, conforme ele próprio, juiz, ele também não é, conforme as minhas divagações, um certificado de justiça e correção. Não que Cristo não seja, mais do que justo, a própria Justiça, mas evocar Cristo para certificar nossa própria justiça e correção é corromper a imagem de Cristo, inclusive quando temos razão – a menos que se trate de uma revelação particular de Deus, o que fazemos é com base em nossos valores, critérios, e coisas do tipo, que podem se basear na Bíblia ou textos religiosos ou não, e mesmo quando se baseiam nisto, ninguém garante, ou pelo menos Cristo não o faz, que determinada decisão está em conformidade com Deus.
Tem coisas que são óbvias: não deixar que alguém morra certamente está em conformidade com Deus, já matar alguém não está. Então, exceto pelas coisas óbvias, temos três alternativas: julgar as coisas sem se importar com Deus nestes julgamentos, julgar as coisas tentando adequar este julgamento dentro dos critérios de Deus, ou fingir que o julgamento foi com base em critérios divinos.
A terceira opção é a dos nobres cidadãos de bem que consentem na degradação humana e ambiental para livrarem a pátria do comunismo e fazer dela um Estado mais cristão que o Vaticano – uma opinião pessoal que não sabemos se Cristo aprova ou não.