#1 Os padres do deserto, que são a origem do monaquismo, foram uma conseqüência do fim da era dos martírios encerrada por causa da legalização do cristianismo, transformado em religião do Império.
#2 O martírio era uma demonstração de fé em Deus que a Igreja aprovava, embora proibisse que fosse provocada intencionalmente.
#3 Com a incorporação do cristianismo ao “sistema”, acabaram as perseguições e o monaquismo foi a maneira que as pessoas encontraram para demonstrar o desapego ao mundo.
#4 O que não é uma “crítica” ao mundo (que, afinal, foi criado por Deus) mas sim ao apego exagerado ao mundo. Com a vantagem de dispensar a crueldade dos martírios (e suponho que Deus, embora valorize aqueles martírios, desaprove qualquer crueldade).
#5 Esta crítica ao apego exagerado ao mundo pode ser vivida, hoje em dia (estamos em 2019) inserida na sociedade, vivendo nas periferias sociais (tanto literal quanto metaforicamente).
#6 A falta de estrutura e o descaso administrativo e político para com as periferias é muito ruim e não merece nenhum elogio, mas sim o combate. Esta vivência religiosa nas periferias é outra coisa: a renúncia ao conformismo com o pecado.
#7 Mais precisamente: não se conformar (ao e) com o pecado, o que não implica em viver aprontando o dedo ao pecado alheio, e sim em viver e buscar viver fora das estruturas, esquemas e sistemas de pecado. Ou seja, corrigir o pecado em si e não nos outros, porque esta correção fraterna cabe à Igreja.
#8 Senão continuamos vivendo apontando os ciscos no olho alheio e cegos à trave que está no nosso olho.
#9 E, além disto, a denúncia silenciosa e inconsciente que emerge do exemplo é quase sempre mais impactante do que falar, falar e falar (porque falar, qualquer um fala).
#10 Enfim, não se trata de querer dar um exemplo, mas de agir em silêncio, e deixar que Deus fale o que, a quem, e como quiser porque nós não estamos em condições superiores uns aos outros para nós arrogarmos ser sua voz – e, sim, somos suas criaturas para ouvi-la quando ele fala.