Tédio. Velho tédio. “Tédio, tédio, mano velho, falta um tanto ainda, eu sei…”. Mau humor. Calor, calor insuportável. Abafamento. Nuvens de chuva secas. Sol quente. Ar imóvel. Sono. Despertar com gritos. Irritação. Insuportabilidade. A incrível capacidade de não suportar nada. A incrível capacidade que tudo tem de ser irritante. Raiva de nada=raiva de tudo. Não existe: silêncio, privacidade, ânimo. Dor de cabeça. Latejar. À beira de um ataque de nervos. A imagem mais sedutora do momento é a de qualquer coisa sendo jogada em qualquer direção e espatifando-se contra o que quer que encontre no caminho. O prazer de quebrar alguma coisa. O prazer de jogar longe. Um dia de Fúria, um bom filme. Dor de barriga. Porquê as pessoas emitem sons? Todas as pessoas poderiam permanecer em silêncio. O Comando Maluco deveria ser fuzilado por um pelotão de fuzilamento. Odeio mulheres gostosas de televisão. Odeio qualquer coisa que passe na televisão. Nos finais de semana, a televisão deveria passar filmes mudos em preto e branco. Eu gosto de alguns filmes preto e branco. Ninguém entende a piada que vi em um filme preto e branco: Hitler fica um minuto inteiro falando coisas em alemão e a tradução é “sim”; em seguida, diz apenas uma palavra e a tradução é um parágrafo enorme cuja legenda ocupa metade da tela. A piada é sobre peculiaridades da língua alemã e não sobre Hitler. Eu não sei contar piadas. Nem histórias. Quem conta bem histórias tem um instinto publicitário e propagandístico muito bom. Eu não sei tornar nada interessante. Ao meu lado, a descida de uma nave espacial na Terra daria sono. Talvez seja esse o meu dom: tornar tudo chato. Eu sou uma coisa anti-interesse. Contrata-se pessoas para tornar um produto chato e sem graça em um objeto de desejo de toda a população; a mim me contratariam para que as pessoas se convençam de que não vale a pena gastar tempo, dinheiro e atenção com alguma coisa. O corpo humano deveria ser proibido de suar. Pessoas que suam como eu deveriam ser presas. Agora sei bem o que significa “um dia modorrento”, nunca entendi bem o que era. Até o calor obssessivo pode ensinar alguma coisa. E, depois que ensinou, poderia ir embora. Eu não aguento mais. Por sorte eu não tenho o poder de destruir as coisas com a força do pensamento, senão tudo o que eu enxergo no momento teria explodido. Todas as coisas continuam absolutamente iguais. Absurdamente iguais. Milimetricamente iguais. Dói ranger os dentes.