O dogma da virgindade de Maria #2

 

 

 Photo by Birmingham Museums Trust on Unsplash

 

O dogma da virgindade de Maria mostra outro aspecto da ação de Deus, além da sua simplicidade desconcertante

Todas as pessoas nascem virgens, mas somente a virgindade feminina, como a de Maria, tem uma marca física, tangenciável, que desaparece quando a virgindade é perdida. Embora fazer sexo não torne alguém uma pessoa adulta, uma relação sexual com uma criança é impossível (pois o nome disto é estupro e será apenas isto mesmo que alguém não chame assim), ou seja, não existe uma criança que não seja virgem. 

Além disto, a infância simboliza, entre outras coisas, a pureza e a inocência, e também é uma condição que Jesus impõe para poder entrar no Reino de Deus. E a virgindade perpétua de Maria é a reverberação da saudação do anjo a ela, “cheia de graça”. Não que ela não tenha se tornado adulta e sofrido como um cão (não só, mas principalmente na Paixão de Cristo), nem que fosse uma mulher infantilizada. Mas esta graça que as crianças possuem (e a possuem até menos do que Maria, que foi concebida sem pecado original) e que, por isto, representam, é perfeitamente simbolizada pela virgindade.

Por isto a virgindade de Maria é uma espécie de redundância dos outros dogmas acerca dela, que já estavam mais ou menos presentes neste da virgindade.

Alguns sistemas elétricos podem ser construídos com redundâncias, dispositivos de proteção que garantem que se a alimentação de algum equipamento for cortada, a energia vai ter outro caminho para chegar até ele, e assim não interromper a alimentação.

A revelação de Deus, realizada em Cristo e registrada pela Bíblia, também possui redundâncias similares (Cristo é o novo Adão, os repetidos perdões de Deus ao povo pecador são imagens efêmeras da redenção definitiva dada a nós por Cristo na Cruz, etc.), que assinalam não só o cumprimento das promessas, mas também a realização delas antes mesmo do cumprimento (pois se a plenitude do cumprimento acontece em Cristo, a redenção, a salvação, o perdão, o amor, etc., de Deus sempre estiveram presentes e operando no mundo).

Os outros três dogmas de Maria (sua Maternidade Divina, sua Imaculada Conceição e sua Ascenção) já estavam presentes no dogma da virgindade de Maria: a pureza da Mãe de Deus, menor apenas que a pureza de Cristo; a concepção totalmente livre e isenta de pecado original; e a continuidade da graça que ela manteve por não ter pecado durante a vida, que a torna digna da Ascenção.

Em si mesmo o dogma é quase insignificante a ponto de parecer até engraçado que alguém tenha se preocupado com isto. Mas a virgindade de Maria é uma espécie de potencialidade que contém em si os outros dogmas acerca dela, que em conjunto testemunham tanto o que precisamos nos tornar (discípulos de Cristo, santos, pessoas que dão à luz a Cristo no mundo, etc.) para a Glória de Deus, um conjunto de testemunhos que se unifica em um só discurso no dogma da virgindade de Maria.

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Os dogmas da Igreja, além dos dogmas marianos, são também testemunhos dos caminhos que Deus abre, como o que abriu para o povo de Deus no Mar Vermelho, para os percorrermos com segurança em direção a Deus (que é a linha de chegada mas ao mesmo tempo caminha conosco). Não é uma segurança fácil, porém, pois o caminho é seguro porque foi aberto por Deus e porque ele o percorre conosco, mas as muralhas de água dos lados são naturalmente assustadoras. Os dogmas estão depositados no leito lamacento do caminho que percorremos em direção a Deus, como seixos que ajudam a firmar os passos e não afundar o pé na lama. Não é possível percorrer este caminho sem sujar os pés nele, como disse o papa Francisco, mas é um caminho de vida que leva, também, à Vida.