Missas

Uma das maiores vantagens de São Paulo é a facilidade de encontrar uma missa. Na área da arquidiocese (que é uma porção abrangente mas limitada da cidade, já que ela se divide entre quatro dioceses) dá para pesquisar missas pelo site da arquidiocese.
Apesar de ter algumas coisas irritantes na busca do site, só o fato se ter esta busca é uma maravilha inigualável.
Além disto, tem missas diariamente das 06:00 às 20:00, embora período entre 13:00 e 15:00 seja problemático – considerando que é um “bom problema”, já que em outros lugares do país a maioria das missas é uma às 07:00 e outra às 18:00 e por isto tem que se virar nos trinta até para ir na missa de domingo, o único dia em que tem mais horários de missa.
Alguns colegas de trabalho acham muito bonito que eu vá na missa quase todos os dias, como se eu fosse um santo por isto, mas eu, particularmente, penso que se eu fosse santo aí sim é que não iria, porque nesse caso não precisaria. Aliás, é bem pelo contrário: eu vou na missa porque eu não sou santo, e acho que se pode medir a minha insantidade pelo tanto que eu vou na missa.

Sobretensão

Há vinte anos atrás eu fiz um curso de eletrotécnica no senai, e nunca dei muita bola para isto. Fui viver outras coisas, fiz filosofia, um monte de faculdades que eu não terminei. Aliás, um monte de vidas que eu ensaiei.

Depois de anos trabalhando sentado atrás de um computador, eu comecei a sentir que não iria mais conseguir viver daquele jeito – não que fosse ruim, mas não era para mim. A sensação que eu tinha era que precisava trabalhar com as mãos. Na verdade eu precisava era lidar com o público, e é isto que eu faço hoje: passo oito horas e meia em pé, atendendo dezenas de pessoas diariamente, e é maravilhoso (tem xingamentos? tem; tem frustrações? tem; tem medo? tem também), mas é maravilhoso mesmo assim.

Só que eu preciso de mais: gosto de atender, e gosto de eletricidade (aparafusar coisas, ligar um treco no outro, testar, calcular, etc.), então decidi (que rolem os dados) retomar a eletricidade na minha vida.

Não sei se vai dar certo: eu preciso descobrir o que mudou de 20 anos prá cá (esses dias eu vi um aparelho com quatro fases: no meu tempo só tinham três fases ou eu é que era mal informado?), e as normas de segurança, os nomes dos aparelhos, as coisas novas que surgiram são itens que eu decidi correr atrás.

Porquê escrever isto? Só para lidar com a ansiedade de um novo plano infalível para a minha vida.

Portfólio artístico

Eu gosto de escrever, e isto é toda a minha arte.
Arte… eu estou ligado à arte por caminhos indiretos: sem ser um artista, sou perpassado constantemente por ela, e às vezes foi ela quem moldou algumas ideias e sentimentos, que no fim se transformaram em ações, algumas das quais se confundiram com o meu “quem eu sou” interno.

Os caminhos que me ligam com a arte – passagens subterrâneas, trilhas sazonais, cruzeiros clandestinos – não fazem de mim um artista, mas me credenciam como público, no sentido de espectador. Nunca se sabe o que o artista quis dizer, mas eu sempre sei bem o que se apresenta diante de mim (“sempre sei” se incluirmos aí aquilo que meu coração sente, que é seu modo de pensar, sobre o que se apresenta).

Eu raramente desfruto daquele prazer de ver (ler, ouvir, etc.) e compreender o contexto histórico, estético, politico ou biográfico que têm as obras de arte (o conceito por trás das deformações cubistas ou a vida da Frida Kahlo que ressignifica cada imagem das obras dela, por exemplo), mas eu sei do (por)que eu gosto do que gosto e isto inclui a movimentação incessante das minhas opiniões, placas tectônicas em um lento mas irrefreável movimento.

A única arte acessível a mim é a escrita, talvez porque as letras já tenham suas formas e eu só tenha que organizá-las direitinho em palavras (que na maioria já estavam inventadas quando eu nasci) numa estrutura paralela à roda-viva das minhas ideias e sentimentos. Mas eu não sou um artista: sem entender nem mesmo o uso dos “porquês” ou a diferença que há entre “através de” e “por meio de” (mas domino o uso da crase, um orgulho que guardo como quem guarda o papel de um bombom que ganhou da garota amada há vinte anos atrás), gosto de certas palavras e às vezes vou testando palavras legais umas com as outras até elas fazerem todas juntas algum sentido.

E, por mais estranho que possa parecer – para mim – todo o resto (imagens, sons, texturas, cheiros, etc.) são palavras: eu ia mencioná-lo, mas não seria capaz de demonstrar a estranheza que é ler também com a pele ou os ouvidos. Talvez eu esteja chamando a leitura de arte e me considerando artista por isto. Mas neste caso, seria como ter obras expostas em uma galeria que só eu posso visitar, o que é muito excitante porém muito vazio.

A Bolha

Metade do que eu já vivi foi só imaginação, e se eu tivesse algum talento literário pelo menos teria uma carreira – que talvez não fosse de sucesso, mas eu preferia ser um escritor medíocre do que não ser um escritor.
O mais interessante é que tudo isto não tem nada a ver com o que eu ia escrever, exceto a parte da imaginação.

Um dos assuntos recorrentes do meu imaginário são as reformas que a Igreja não promoveu: ordenação feminina, comunhão de divorciados, casamento homossexual, etc.

Normalmente eu imagino como este tipo de mudanças podem ser compatíveis com a doutrina católica, e também se são compatíveis – o que poderia ser, como de fato já foi um dia, um exercício de orgulho, pois eu pensava como se eu decidisse essas coisas, mas que se transformou num exercício (difícil) de humildade (que acontece depois, enquanto eu lembro a mim mesmo que são decisões que não cabem a mim, embora isto não me exima de pensar sobre os assuntos).

Geralmente eu concluo que das duas, uma: ou estas reformas nunca irão acontecer, ou irão, mss este não é o momento adequado; como Deus sabe o que faz, se não ocorreram é porque ele não quer que ocorram (seja agora, seja nunca), e como Ele não me faz confidências, eu só posso especular e mr esforçar para manter minhas especulações dentro do seu extrato especulativo (o que é óbvio, mas é difícil e este é o exercício de humildade).

A minha mais recente teoria/especulação é a seguinte:

Não importa, talvez porque não adiante, reformas na doutrina católica enquanto nós católicos vivermos dentro de uma bolha de virtuosidade cristã.

Eu vou na missa todo domingo, rezo alguma coisa todos os dias, mantenho o celibato há (pouco) mais de um ano e leio a Bíblia diariamente, mas tudo isto não deveria me dar a sensação de segurança que, no fim das contas, isto tudo me dá. Eu frequentemente me lembro, ou sou lembrado, de que tudo isto, que eu devo manter, não me coloca em uma posição privilegiada em relação “aos pecadores” (segue uma lista de motivos, porque eu adoro listas):

– porque quem me ([pronome] nos) salvou foi Cristo, e não minhas boas ações
– porque mesmo as minhas boas ações podem estar impregnadas de erros (quem garante que o pacote de bolachas que eu comprei pro cara que me pediu comida na rua não vai virar moeda de troca na biqueira, enquanto que o outro, pra quem eu disse que eu não tinha nada, realmente fosse comer as bolachas e nem fosse usuário?)
– os pecados que eu evito, os evito graças a Cristo, e não aos meus méritos (eu só giro a chave do carro, Deus é quem liga o motor e depois conduz o carro, e Deus sabe como é difícil pra mim até mesmo girar esta chave…)
– eu precisei aceitar Cristo na minha vida para fazer as coisas que a maioria das pessoas faz sem precisar rezar todos os dias e ir na missa todo o Domingo (imagino as coisas incríveis que essas pessoas fariam se fossem um pouco mais religiosas, considerando o quanto já são incríveis sem estar comprometidas com Cristo)
– mesmo os pecados que eu evito, ainda permanece um certo impulso para cometê-los; o que mais me incomoda nisto (além da incômoda batalha contra alguns impulsos) é ver o quanto me falta aceitar de coração o que eu já aceitei racionalmente (“na volta do barco é que [a gente] sente o quanto deixou de cumprir”), e é este item que encerra esta lista e põe o texto de volta no rumo da teoria/especulação.

Eu não sei se (e não acho que) nem todos nem a maioria dos católicos padeçam dos males do último item da lista, mas tenho a sensação de que uma boa parte de nós (universo “pesquisado”: a internet) viva como uma comunidade dos justos de Deus.
Homossexualidade é pecado, aborto também – mas que moral eu tenho de apontar mesmo estes pecados nos outros? “Ah, mas o pecado deve ser denunciado” está certo, mas porque concentrar as denúncias na homossexualidade e não na promiscuidade que impera na heterossexualidade?

Eu, por exemplo, já fui mais promíscuo em todas as minhas (forever alone – poucas) relações (hetero) sexuais do que o que eu sei que fizeram a maioria dos homossexuais que eu conheci.

Como eu, que tudo o que faço pela minha filha é mandar dinheiro pra mãe dela, posso apontar o dedo para os pecados dela (a mãe) quando é ela quem cuida – todos os dias, o tempo todo – da menina tal e qual Deus cuida de todos nós? O dia em que a minha filha me perguntar se Deus sempre está conosco, o melhor exemplo que eu vou ter para dar vai ser a mãe dela (“olha minha filha, se a mamãe que é só uma pessoa como todo mundo fica o tempo todo contigo, quanto mais Deus que é Todo-Poderoso etc.”) e não eu, que, exceto o fato de não ser ordenado (um fato gigantesco, é verdade), poderia rezar uma missa de olhos vendados com um pé nas costas (espero nunca precisar: rezar uma missa, nem ter os olhos vendados nem os pés nas costas).
O que eu estou tentando exemplificar a partir de mim é que se nem os santos canonizados vivem em um pedestal (o que fica em pedestais são obras de arte representando estes santos), quanto mais nós, que ainda gememos e choramos neste vale de lágrimas (quem dera fosse só uma metáfora) podemos nos colocar sobre pedestais.

Assim como eu acho que esta histeria coletiva cristã anti-aborto-lgbt-feminismo-etc mascara mais pecados do que aqueles que pretende combater, também acho que a histeria anti-cristianismo-opusdei-igrejacatólica-etc está errada: são duas histerias se retro-alimentando enquanto que tanto o pecado quanto as inustiças sociais continuam se disseminando (inclusive em projetos de governo).

Eu, particularmente, tento todos os dias estourar minha bolha de virtuosidade pessoal (que muitas vezes estoura à minha revelia), e acho que todos estes formadores de opinião católicos poderiam dedicar uma parte de suas inteligências para ver se no meio de todo o joio que estão queimando, não tem uma quantidade ainda maior de trigo (eu ia escrever mais, mas eu gostei tanto da frase anterior que vou encerrar este texto aqui, para fechá-lo com – o que eu acho que foi uma – chave de ouro).

Este mundo e o outro

Deus criou o mundo e viu que era bom. E mesmo depois de estragado, retorcido e distorcido pelo pecado, Deus não mudou de opinião, a prova disto é que não abandonou o mundo à própria sorte. Somente seguindo pelos caminhos de Deus é possível não desistir deste mundo.
Quando eu tentei salvar o mundo por caminhos alternativos, o sonho de um mundo melhor se tornou uma ilusão, e se tornou necessário, neste caso, que eu me agarrasse ao que deixou de ser um sonho para se tornar uma miragem.
Insistir em tornar o mundo melhor é – pelo menos para mim – uma necessidade, porque o mundo não pode continuar do jeito que está. Mas esta insistência em melhorar o mundo não pode ser às custas se negligenciar o Reino de Deus. Esta negligência é que leva aos caminhos alternativos que transformam a insistência em melhorar o mundo numa ilusão.
Mas foi fácil, muito fácil, ficar olhando para o céu e esquecer o chão em que eu pisava. Não foi à toa que Cristo disse que o Reino do Céu está entre nós, e que depois da ascensão, os anjos vieram perguntar por que os discípulos ainda estavam olhando para o céu. A busca pelo Reino também tem os seus perigos e ilusões, uma das quais é se refugiar do mundo nas ideias e sensações celestes. Buscar primeiro o Reino de Deus supõe buscar mais coisas além do Reino – pois Cristo não disse “buscai SOMENTE o Reino de Deus”, e sim PRIMEIRO. Refugiar-se nas coisas celestes é uma distorção tão nociva quanto ignorá-las.
A saída que eu encontrei foi desconfiar de tudo, mas a paranóia foi pior do que as negligencias anteriores.
No fim, restou o abismo e Deus, e eu decidi dar uma chance a Deus porque qualquer coisa, o abismo daria um fim em tudo, pelo menos para mim.
Optar por Deus é um trabalho diário, constante, em um minuto tudo está bem e no minuto seguinte tudo está desmoronando e quando eu percebo eu estou escorregando pelo abismo. É um trabalho, aliás, impossível, que somente Deus torna possível.
Deus torna possível buscar primeiro o Reino de Deus e depois um mundo melhor. Deus torna possível desconfiar de tudo sem que isto vire uma paranóia, porque basta pôr a confiança em Deus (mesmo que a minha confiança vacile, como o sinal do celular dentro de um carro passando por um túnel, Deus vem em socorro, qual uma antena parabólica de emergência – ele que é também o sinal). Deus torna possível manter o mínimo de sanidade possível até que os tremores de terra terminem. Se eu estou crucificado com Cristo como São Paulo, e morri para este mundo, não foi como Cristo ou como o apóstolo, que o fizeram de maneira heróica, consciente, e santa.
Para um suicida, a morte não é uma solução, mas sim uma adequação: no caso, matar o corpo para adequá-lo ao coração que já tinha morrido muito antes. Deus é para mim o equivalente a uma mistura de esqueleto de adamantium do Wolverine com o exoesqueleto do Robocop (sem a lavagem cerebral dos dois, é claro). Mas, diferente destes esqueletos, Deus encontrou, não sei em que parte, alguma vida no meu coração.
Eu não saberia dizer se agora meu coração bate por si só, ou se funciona ligado a aparelhos, onde Deus faz às vezes dos aparelhos. Se der para comparar viver em Deus a respirar por aparelhos, tenho que fazer a ressalva que Deus é um Aparelho que continua – não me pergunte como – conectado mesmo quando o desconecto, para que eu não morra por um vacilo ou mil.
Se eu já havia jogado fora a minha vida e só restava adequar meu corpo ao meu coração, a vida que eu tenho para oferecer a Deus é a que ele próprio providenciou, uma vez que eu não tinha mais vida, estava apenas clinicamente vivo.
Tudo isto para eu continuar a buscar um mundo melhor, logo depois de buscar o Reino de Deus.

Prem Baba

A notícia sobre a acusação de abuso sexual contra o Prem Baba me levou a refletir sobre a minha passagem por uma comunidade tântrica que oferece a possibilidade de cura pelo sexo.

Seria injusto não explicar o que (eu penso que) eles entendem que fazem, pois seus terapeutas e mestres realmente acreditam estar revolucionando a saúde, o sexo e a espiritualidade humanas.

Enquanto eu estava lá a proposta era dessexualizar o sexo e canalizar o prazer sexual obtido por meio do contato não sexual para uma cura a princípio psicológica, que poderia evoluir para uma cura física baseada na crença de que os males físicos são o resultado da somatização de bloqueios psicológicos.
A partir daí, as barreiras para a autorrealização integral (manifestada pela prosperidade material) cairíam; além disto, o prazer sexual entre duas pessoas poderia ser potencializado (embora o sexo terapêutico não fosse um serviço oferecido pela empresa, duas pessoas poderiam praticar um sexo tântrico-terapêutico entre si, e o ensino da prática deste sexo era um dos serviços oferecidos na comunidade, embora os terapeutas apenas orientassem as práticas sexuais, sem no entanto participarem delas enquanto as ensinassem); e ainda havia a possibilidade de uma pessoa, enfim curada, tornar-se ela própria uma terapeuta.
Embora houvessem pessoas que desvirtuassem os propósitos da comunidade (o centro onde a empresa oferece os seus serviços), os seus dirigentes desestimulavam e puniam (proibindo o uso do nome da empresa) terapeutas e aprendizes que fossem flagrados fazendo isto.

Feitas estas considerações, eu penso, hoje, que estas terapias sexuais são um sintoma da opressão sexual em que vivemos, que coloca todas as respostas no sexo, sobrecarregando-o de responsabilidades: fazer bem à pele, aliviar a tensão, afirmar-se, conhecer o próprio corpo, sentir aceitação, manter a atenção de outra pessoa, etc.

Oprimir o sexo poderia ser uma metáfora, mas quando o sexo se torna uma ferramenta de auto-conhecimento, um caminho para a interiorização e todo esse tipo de coisas, o peso do resultado recai sobre o outro ou sobre a própria pessoa, e o sexo sempre vai fracassar quando se tenta usá-lo para tudo isto, e o sofrimento do fracasso recai sobre quem transou.

Eu sou católico e, portanto, minha opinião sobre isto não é isenta: mas não existe nada que se consiga com o sexo que se consiga de um jeito melhor por outros meios. A não ser bebês.
Com exceção da reprodução humana, o sexo se tornou o que os remédios alopáticos são para os homeopáticos: um tratamento intenso, tóxico, e pontual, porque – tanto o sexo quanto a alopatia – resolvem as coisas somente superficialmente e a curto prazo. 

Na minha urna

Atualização pós-facada:
O atentado contra o J.B. foi ruim por ser um atentado contra a vida, por servir como argumento para um discurso (falso) de vitimização da direita e por fortalecer a candidatura dele, então eu acho que vou trocar a Marina pelo Haddad mesmo, e trocar o Suplicy por outra candidata.

Nestas eleições eu estou tendo que virar um cientista político especializado nas minhas próprias prioridades políticas, simbolismos e sacrifícios ideológicos.

O perfil do meu candidato ideal é:
– mulher
– que não seja os mesmos de sempre
– que seja de esquerda
– que seja cristão
– que não fomente o ódio
– que não queira acabar com a homossexualidade por decreto
– que não queira afirmar a homossexualidade por decreto
– que pareça entender que o aborto e o descaso com as mulheres (sejam as grávidas, sejam as com filhos pequenos, sejam as que não tem filhos) são o mesmo pecado
– que priorize as pessoas físicas em detrimento das pessoas jurídicas mas entenda que as empresas não são o inimigo
– que tenha o mínimo compromisso com uma distribuição de renda mais justa
– os outros critérios são pautas clássicas da esquerda

Então, para presidente, talvez eu vote no PT, principalmente por causa da Manuela (que é do PCdoB, eu sei), mas o problema é o Haddad – não que eu desgoste do Haddad, pelo contrário: acho que ele deveria ter sido lançado candidato a governador, tanto porque ele é mais conhecido em SP, quanto por ele ter mais condições de vencer o Dória, mas o PT resolveu colocá-lo como representante do Lula, provavelmente, por ser um dos poucos casos dentro do PT que não tenha o rabo preso (vontade de matar o PT por isto!). Acho que o PT deveria ter invertido a chapa e aceitado ser vice da Manuela (não com o Haddad, mas sim com o Suplicy) que também teria em seu favor o fato de ter sido endossada pelo Lula, e se fosse a Manuela a candidata eu iria até pra rua fazer campanha pra eles.

Mas do jeito que está, eu vou acabar votando na Marina, apesar do ranço dela contra a Dilma (que infelizmente é recíproco) e apesar de já ter apoiado o Aécio Neves (pobre Chico Mendes se revirando no túmulo…) – e não sei o que é pior nisto: ter apoiado o Aécio ou ter feito isso nem tanto pelo Aécio mas sim contra a Dilma…

Para o Senado, Suplicy. Em vez de pensar nisto como um sacrifício do perfil em que eu quero votar, estou pensando que ele entra na cota reservada para homens (porque eu também não posso ser radical acreditando que as mulheres vão salvar o mundo: é o protagonismo delas que vai melhorar o mundo, inclusive e em primeiro lugar para elas, eu espero); além disto o Suplicy apoia o pe. Júlio Lancellotti e o vicariato do povo de rua, o que para mim conta muitos pontos também (ter cantando Bob Dylan no congresso conta menos, mas também é um fato positivo :).
Além dele, a Rede (que não me interessa muito como partido, e sim como partido da Marina) tem uma candidatura coletiva encabeçada por uma mulher chamada Moira Lázaro, e provavelmente o meu segundo voto para o senado vai para ela(s).

Para deputado federal está mais complicado: Sâmia ou Erundina? Erundina ou Sâmia? Quando eu penso que ser católico e votar no PSOL pode parecer incoerente, eu lembro que ser católico e votar no Bolsonaro seria ainda mais incoerente (para votar em alguém sem culpa, eu votaria no Papa Francisco, mas como eu nunca vou ser um cardeal, estou fadado a escolher sempre com um pé atrás). Erundina ou Sâmia? Sâmia ou Erundina? A Erundina tem a favor toda a história política dela, enquanto que a Sâmia tem em seu favor o fato de ter entrado para a política faz dois anos. Sâmia ou Erundina? Erundina ou Sâmia? A Erundina é nordestina, e a Sâmia era, até virar vereadora, uma funcionária qualquer como todos nós. Erundina ou Sâmia? Sâmia ou Erundina? Por sorte, na dúvida, eu posso votar na legenda e seja o que Deus quiser. Sâmia ou Erundina? Erundina ou Sâm… tá, agora chega!

Para governador, professora Lisete, mas dividido entre ficar aliviado por votar em uma governadora e apreensivo por ela ser menos conhecida que o Dória e (valei-me minha Nossa Senhora dos serviços públicos que deveriam ser gratuitos e de qualidade) correr o risco dele ganhar e vender tudo como se o estado de São Paulo fosse uma gigantesca 25 de Março.

Para deputado estadual, do nada (nem tão do nada assim) eu encontrei um Mandato Coletivo Feminino, um Megazord de mulheres de quem eu nunca tinha ouvido falar na vida, o que é um risco (mas a segurança que eu sinto nos nomes famosos é tão ilusória…) que também é o preço da expectativa de renovar a política.

Aí, relendo o texto antes de publicar, eu percebi que o único voto que eu pretendo dar sem muita preocupação é para o Suplicy, o único homem da minha lista.
Se não fosse a concorrência com a Sâmia Bomfim, este voto despreocupado seria também na Erundina; e se não fosse o ranço anti-Dilma da Marina, o meu voto nela também seria despreocupado (primeiro pelo anti-dilmismo, mas também pelo receio do que ela possa fazer, se for eleita, por causa da triste porém justificada amargura contra o PT).
Embora eu tenha todas as explicações do mundo para estas ressalvas pontuais contra todas as mulheres em quem eu pretendo votar (a amargura justificada da Marina, o partido da Moira Lázaro, a concorrência entre a Erundina e a Sâmia, o risco-Dória no caso da professora Lisete e o absoluto anonimato de onde saiu, para mim, o Mandato Coletivo Feminino), é sintomático que apenas as candidaturas femininas tenham alguma ressalva.

Em cima do muro ou em uma zona de fronteira?

Aborto é um pecado, independente de ser crime ou não. Por outro lado, as condições de carência (material, psicológica, espiritual, etc.) também são pecados, portanto o pecado das mulheres que abortam é consequência de pecados cometidos contra elas por outras pessoas – quase sempre homens.

O fato de elas serem vítimas não justifica que elas façam outras vítimas, mas expõe a brutalidade de quem recorre ao terrorismo psicologico em defesa da vida quando o correto deveria ser direcionar as palavras e as ações pró-vida para manter e divulgar meios de proporcionar condições para as mulheres terem, parirem e criarem seus filhos: o aborto é uma solução mais fácil e preguiçosa em comparação a levar adiante uma gravidez; mas combater ferozmente a descriminalização do aborto é igualmente uma solução fácil e preguiçosa em comparação a comprometer-se e empenhar-se pela vida dos fetos, dos recém-nascidos, das mães e das mulheres que não são mães mas também são tão violentadas quanto os inocentes massacrados antes de nascer.

Eu, que no passado já ajudei uma amiga a tentar abortar, me posiciono contra o aborto e por motivos religiosos, os mesmos motivos que me impedem de apoiar as campanhas contra a descriminalização do aborto.

Se os defensores da descriminalização estão pecando e os defensores da criminalização também estão, “…tu, porém…”, eu, neste caso, “… quem és, para julgares o teu próximo?” (Tg 4, 12), mas se estão pecando, eu também, que em toda esta batalha pela vida, tenho apenas esta postagem nas minhas mãos.

Se eu não vir as marcas dos pregos…

A passagem em Jo 20, 25 representa, principalmente, a incredulidade no Cristo  que não se vê (um resumo raso e incompleto), o que ilustra também a minha fé inconstante.
Mas além de me ver representado nisto, me vejo representado em um pormenor secundário da atitude de São Tomé: a presunção excessiva do próprio protagonismo – o que significa que eu me acho mais do que o que eu sou.
O pensamento que eu vislumbro por trás do “se eu não vir as marcas dos pregos etc.” é “como assim Jesus apareceu sem que EU estivesse presente?!?”; e a prova exigida deixa de ser um indício de incapacidade de crer no invisível para se tornar em negar a fé (e o bom senso ao mesmo tempo) porque Cristo mandou recado pelos outros ao invés de ter se mostrado ao vivo e em cores para mim.
Talvez no fim das contas este pormenor não  se aplique a São Tomé e o caso traga à tona pecados meus e não os dos outros; afinal Cristo apareceu depois de novo, com São Tomé presente desta vez – o que pode significar que o apóstolo seja mais importante do que eu (autoironia).
Mas fica o recado pra mim: “confia mais nos outros e não fica achando que o mundo para de rodar se você não estiver por perto”.

Efésios e a submissão das mulheres parte II

Nova teoria:
S. Paulo pede que as mulheres sejam submissas aos maridos (Ef 5, 22), e justifica, no versículo 23, assim: “Pois o marido é a cabeça da mulher, assim como Cristo é a cabeça da Igreja, ele, o Salvador do seu corpo.” (“ele” se refere a Cristo, suponho).
Bem, Cristo é a cabeça da Igreja, o Rei e Senhor, cuja coroa é de espinhos, e, Senhor da Igreja (esta, sua esposa submissa), se humilhou e se sacrificou por ela.
Então, se São Paulo está “condenando” as mulheres à submissão aos maridos tal como a Igreja se submete a Cristo, São Paulo também está “condenando” os maridos a agirem como “reis e senhores” (tal e qual Cristo), se humilhando e se sacrificando por elas. Porque se Cristo, o único Rei e Senhor agiu assim, os maridos, que devem ser a imagem do seu Rei e Senhor, devem seguir o exemplo.
Cristo reina sobre a Igreja, mas não vem ditar ordens à sua Esposa: errando ou acertando, está aí há 2000 anos procurando fazer a vontade de Cristo.
“Ah, mas olha os horrores e atrocidades que a Igreja blá blá blá” – bom, quem nunca errou tentando acertar? Quem nunca tomou um caminho errado na vida? A Igreja, aliás, não erra nunca, mas seus “operadores” erram na operacionalização: a Igreja compreende a vontade de Cristo, e os encarregados (Papa, bispos, leigos, etc;), às vezes, erram, e erram feio na execução desta vontade (erros que podem ser macabros como a Inquisição). Duvido que a vontade de Cristo sejam assassinatos em massa, e duvido que a Igreja tenha entendido “evangelizar” como uma licença para matar; mas quem foi lá operacionalizar a função agiu, acredito, conforme aquilo que carregava no coração (e, mais uma vez, há duas dimensões nisto: de um lado, o pecado hediondo de oprimir as pessoas pretensamente em nome de Deus, e, de outro, quem se permite atirar a primeira pedra?).
Acredito, enfim, que apedrejar a Igreja é, espiritualmente, apedrejar mais uma vez as mulheres. E assenhorar-se de uma ou de várias mulheres, seja em nome do que se lê em Efésios, seja por qualquer outro motivo, é usurpar o sacrifício de Cristo, o Todo Poderoso que se deixou ser humilhado, açoitado, morto e sepultado pelos nada poderosos.
Acho que o conselho de Paulo não era para soar como “obedece, muié!” (conforme o entendimento cristalizado ao longo dos séculos), e sim como uma lembrança de que, diante de um homem capaz de agir como Cristo e se humilhar (pois é isso que faz a cabeça da relação), cabe às mulheres não usarem seu poder para sujeitar à força quem deveria estar se sujeitando espontaneamente (ou seja, os homens), e sim lembrarem também que, poderosas, valem para elas o mesmo “modo de usar seu poder” apresentado por Cristo.
No fim das contas, penso que o norte do conselho de Paulo seja “Vós, que temeis a Cristo, submetei-vos uns aos outros…” (Ef 5, 21).

Veneno anti-ressentimento

A minha luta contra o ressentimento é parecida com alguma luta contra o mofo, porque o ressentimento é um sentimento mofado, estagnado, podre porém vivo.
Até mesmo um bom sentimento, que seja agradável, mofa e apodrece vivo.
O ressentimento não é em si um sentimento, mas um modo de sentir. Não sei se existem outros modos de sentimento além de sentir ou ressentir, mas sei destes dois.
A minha questão agora é como pode ser possível sentir, novo-sentir, algo assim.
Porque desmontar ou destruir o ressentimento é importante e necessário, mas construir algo novo também é.

F-15

Há pouco tempo eu tentei – e logo desisti de – tentar virar um escritor freelancer. Uma pessoa precisa saber reconhecer tanto suas habilidades quanto suas incompetências, e eu precisei admitir a minha incapacidade.
Veja bem: eu não escrevo mal. Mas não tenho a capacidade de fazer com que coisas desinteressantes se tornem interessantes – para ser mais preciso, o que eu não tenho é a capacidade de fazer com que coisas desinteressantes pareçam interessantes, e acho que isto é um mérito meu (o que não desmerece a capacidade de fazer isto em quem a tem).
É claro que tudo pode ser aprendido, a persistência é a mãe da competência, etc., mas eu quero respeitar certos limites que, mesmo sabendo que posso ultrapassá-los, mesmo assim eu desejo permanecer dentro deles.
A minha desistência se fundamenta em eu não gostar de ser atraído web afora por textos com manchetes que despertam a curiosidade mas não vão além da própria manchete; em eu ter me cansado de buscar informações sobre um assunto e encontrar desde divagações  aleatórias sobre ele até divagações acompanhadas de links onde poderiam haver informações sobre as informações que eu procuro; em eu ter me cansado de ler verdadeiras acrobacias literárias  que tentam me despertar alguma emoção nobre (e não conseguem) enquanto anúncios do Google pedem cliques desesperadamente ao redor e no meio do texto… há sites que parecem a feira do Ceasa ou a 25 de Março na véspera do Natal, mas sem a vida e sem a graça que tem na bagunça enlouquecedora do Ceasa ou da 25 de Março.
Eu preciso me comprometer com as palavras que eu escrevo, e embora eu possa aprender a passar por cima disso, não sou nem quero ser um F-15 para passar por cima.

Quem sou eu hoje

Linha do tempo
Agora que eu retomei o blog, eu sinto a necessidade de também retomar a ideia originária dele: o endereço deste blog é “minhageografia” porque ele – o blog – é para representar uma linha que só às vezes é reta, mas na maioria das vezes faz curvas, voltas, volta atrás e depois transforma em frente o que era um dos lados, e  além de ser uma linha com caminhos tortuosos, às vezes é múltipla, sem deixar de ser a mesma, às vezes cada linha da multiplicidade avança em velocidades diferentes, em retas e cruvas  diferentes, uma passa por cima da outra, dá um nó, tem que cortar e emendar – ou às vezes deixar lá o nó; e isto tudo significa que a linha que o blog representa não é uma linha do tempo.

Código Morse
O tempo é, ele próprio, uma linha, e uma linha do tempo é um destaque nesta linha mais larga, é uma linha em negrito dentro de um fluxo maior e indiferenciado. Por isto existe uma graduação em História e historiadores profissionais: todos vivemos o tempo e percorremos suas linhas, mas elas não são facilmente pensáveis. Tem que estudar.
Eu não sou historiador, e também não sou geógrafo;  mas faço a minha geografia sem ser qualificado, assim como as outras pessoas fazem a sua história sem qualificações também.
Eu precisei falar em linha, em descrevê-la tortuosa e errante, para ressaltar sua diferença de uma linha  do tempo, histórica, temporalmente  ordenada. Mas a verdade é que este blog não representa, de verdade, uma linha, e sim pontos. Um ponto, uma coleção de pontos próximos, pontos ligados entre si por uma linha ou outros pontos, pontos maiores que se tornam espaços ou regiões no espaço, enfim, locais que ocupam um tempo e um espaço, mas onde o tempo é sempre um hoje que transforma completamente  este espaço.

Mais do mesmo
Quando eu comecei este blog, aliás, eu pensei que desviar a atenção do tempo e redirecioná-la ao espaço era uma ideia radicalmente inovadora – até me dar conta de que era apenas  praticidade: eu não consigo lidar com o tempo, portanto me voltei ao espaço para ver o que eu posso fazer com aquilo que o tempo fez nele.